“Los Abrazos Rotos” – Almodóvar Irrepreensivel.

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Já vem sendo hábito… Com “Los Abrazos Rotos“, Pedro Almodóvar assina um dos melhores filmes do ano, independentemente dos filmes que estrearão até ao final de Dezembro. Para mim, este Almodóvar Colheita 2009, está ao nível dos seus Orscarizados filmes, “Tudo Sobre Minha Mãe” e “Fala Com Ela“, dois dos mais arrebatadores filmes dos últimos 10 anos. Drama clássico com um triângulo amoroso no centro (embora ao longo da estória mais vértices aparecem, distorcendo-lhe a forma), com uma narrativa a dois tempos e uma fabulosa atenção aos pormenores que compõem as imagens e o texto.

Abraços Desfeitos” é a quarta colaboração de Almodóvar com Penélope Cruz, depois de “Carne Trémula“, “Tudo Sobre a Minha Mãe” e “Voltar“, e nota-se o à vontade com que ambos se movem criativamente nos mesmos terrenos. Cruz está mais mais madura, mais experiente, dando à personagem Lena, uma mulher dividida entre dois homens e o que cada um tem para lhe oferecer, uma profundidade e uma contenção emocional digna de nota, mantendo o filme acima de linha do melodrama lacrimejante em que facilmente se podia tornar. Lluís Homar, no papel de um escritor cego, ex-realizador de cinema, que muda de nome quando um acidente lhe tira a visão, é o personagem central da narrativa, o último sobrevivente do triangulo e aquele que continua a lutar para exorcizar os fantasmas do passado. José Luis Gómez é o 3º vértice, abastado homem de negócios, poderoso, ciumento e vingativo marido de Lena. Ambos são excelentes nas suas composições, física e emocionalmente irrepreensíveis.

Este é o filme de Almodóvar mais centrado sobre a Paixão, o arrebatamento de umas pessoas pelas outras, dependendo por isso do trio de protagonistas e das suas composições, passando para o espectador esses sentimentos de uma forma tão imediata e sentida. Fazem ainda parte do elenco Blanca Portillo, Rubén Ochandiano (dois personagens que deformam o tal triângulo) e Tamar Novas, personagem chave no decifrar da trama. A nível de personagens e interpretações tudo encaixa perfeitamente na complexidade da narrativa de Almodóvar, com todos os actores a saberem elaborar perfeitamente o personagem que lhes coube em sorte.

Mais uma vez, este Almodóvar é um festim para os sentidos, com um trabalho de fotografia e direcção artística absolutamente primoroso. Cada plano está milimétricamente estudado para atingir um objectivo emocional no espectador. O que aparece é tão importante como o que só se ouve e nota-se um rigor estético que se funde com o guião,  garantindo cada plano que estava na cabeça de Almodóvar desde a escrita, tornando-o numa manifestação emocional do argumento ao longo da narrativa. Além disso a maioria dos planos são obras de arte em movimento, alterando entre a POP ART característica de Almodóvar (evidente no cartaz reproduzido acima) e um Impressionismo estranho à sua obra, mas que ao invés de destoar a complementa. Exemplo disso são muitos dos planos abertos na Ilha de Lanzarote, como o que reproduzo abaixo e aquele em que uma imagem aérea em tons de cinzento e verde é atravessada por um carro vermelho.

Rodrigo Prieto, habitual director de fotografia de Alejandro González Iñárritu ou Oliver Stone, com um currículo riquíssimo de que fazem parte, por exemplo, “Brokeback Mountain” (de Ang Lee), “Babel” ou “A Última Hora” (de Spike Lee), assina aqui um dos seus melhores trabalhos. Alberto Iglésias na música, José Salcedo na montagem e Víctor Molero na direcção artística, dão contributos importantíssimos para a unidade de um projecto complexo e emocionalmente abrangente.

E o maestro Almodóvar que, mais uma vez, conduz todos os colaboradores de forma rigorosa, mantendo o filme intenso, misterioso, divertido a espaços, mas sempre, sempre arrebatador e marcante. O seu trabalho de escrita é de uma complexidade e clareza impressionantes, sabendo perfeitamente a cada momento onde quer chegar e que emoções quer despertar no espectador.

Existem, claro, um ou dois senãos: Uma das revelações que acontecem lá mais para o final é clara desde muito cedo e, o final é um pouco leve demais para suportar o peso emocional do resto do filme, mas isso é pouco para estragar uma obra grande do mestre Almodóvar.

No final, e feitas as contas, só não leva 5 por não me ter atirado emocionalmente ao chão como “Fala Com Ela”, apesar de ter estado muito lá perto. “Abraços Desfeitos” está em exibição e é imperdível.

Classificação: 4.5/5

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